O sofrimento pode ter sentido, transformar-nos por dentro.
É preciso paciência.
Porque o tempo parece nunca mais acabar e somos projectados para um ponto muito longe do convívio entre os humanos.
Faz parte do sofrimento deturpar as coisas, vê-las através de lentes tão fortes que facilmente entontecemos, nos desequilibramos, caímos.
Temos medo de tudo, de nós mesmos.
A simples superficie das coisas nos agride.
Somos assaltados por demónios que nos roem a alma.
É um tormento em que nos atormentamos.
É preciso ter paciência e o mais das vezes não a temos.
A violência da vida bate-nos em cheio.
Procuramos abrigos e todos cedem e nenhum é suficiente.
Recordamos a paz que perdemos como o bem mais precioso, ignoramos o caminho que nos traga de volta a nós próprios.
Falta-nos a coragem, mas para ela nem encontramos motivo.
O mundo todo é um mal-entendido que aguardamos que se resolva ou estoire e enquanto nada acontece sofremos.
Agarramo-nos a coisas que se nos escapam entre os dedos.
Só a morte está por todo o lado desperta, cerca-nos, olha-nos com os olhos muito abertos, mete medo.
Fechamos os olhos, mordemos os lábios, fugimos para debaixo da cama e não há maneira.
O amor é uma coisa tão distante, tão impossível.
Vivemos, momento a momento, uma solidão que nos aperta a garganta, faz de nós o que quer.
Uma música, uma palavra, uma folha caída e é o suficiente para nos trazer uma irremediável precisão de chorar.
E quando choramos não sabemos bem porque o fazemos, é só a tristeza a tomar conta de nós.
O sofrimento pode ser sentido, transformar-nos por dentro.
Meu deus, fazei que assim seja.
Dai-nos a paciência e uma pequena esperança.
Ajudai-nos a aceitar quem somos.
Salvai-nos da confusão.
Obrigai-nos a prosseguir, porque ignoramos.
Pedro Paixão, Amor Portátil
Num momento em que este texto poderia ter sido escrito por mim, fosse eu tão hábil com as palavras.
This is me!
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